2009/06/27

Trabalho da Disciplina Sociologia da Religião, na Pós-Graduação Latu Sensu em Ciências da Religião do UNIFLU/FAFIC

Compartilho um humilde trabalho em Sociologia da Religião ao Prof. Dr. Adailton Maciel Augusto, que fiz na Pós-Graduação Latu Sensu em Ciências da Religião do Centro Universitário Fluminense/Faculdade de Filosofia de Campos (UNIFLU/FAFIC) que estou cursando. Não reparem pois há muito o que corrigir até porque o fiz na madrugada e no estourar do prazo de entrega. Em todo caso o apresento na sua originalidade:

Fonte:
* MENDONÇA, Antônio Gouvêa. Dois pioneiros e un passeur de frontières. In: TEIXEIRA, Faustino (org.). A(s) ciência(s) da religião no Brasil: afirmação de uma área acadêmica. 2ed.. São Paulo: Ed. Paulinas, 2008, p. 251 – 295. (Col. Religião e Cultura).


No universo acadêmico as Ciências da religião apresentam-se como uma área particularmente polêmica, sobretudo ao campo das Ciências Sociais, que no caso deter-nos-emos na Sociologia e História enquanto ciência colaboradora para o pensamento sociológico. Até porque não há consenso se a Religião pode ser tomada como objeto de investigação sociológica, visto que as próprias “Ciências da Religião” é uma área nova e polêmica, pelo próprio modo de ser e dos agentes que se propõe a estudá-la, partindo do princípio que enquanto “ciência”, segundo os moldes estabelecidos de constituição do modus perandi da ciência enquanto um saber de fato, há três princípios básicos que é a pretensão de neutralidade, método e objeto reconhecidamente como o que apresentando elementos de acordo com o “cânon” da ciência.
Falamos que não há consenso sobre a Religião enquanto objeto propriamente científico para ser investigado, pois a falta do consenso não se encontra somente no campo científico, pois até no plano filosófico há divergências no que tange a própria existência e validez da religião enquanto ela apresenta-se como promotora de sentido nas populações durante os séculos. Não é a toa que já se determinou a “morte de Deus”, o fim da entidade base da perspectiva existencial e epistemológica dos humanos durante a história e o processo de secularização foi que a transfigurando e re-significando a “religião” na contemporaneidade. Essa transfiguração apresenta uma confrontação conceitual no que diz respeito aos trâmites intelectivos próprios da religião enquanto dimensão constitutiva do humano. Alguns pensadores propõem que numa perspectiva materialista chegaremos à superação da religião e seu fim. (Marx)
É nesse clima que estamos situados, um clima de instabilidade e compreensões diversas sobre “religião” e as Ciências da Religião (ciências compreendidas também no seu original como conhecimento) têm uma grande produção de pesquisas que versam na elucidação da validade de um objeto para investigação e que a “Academia” pode e também “deve” levar em consideração.
No campo das Ciências Sociais, historicamente temos a influência francesa na investigação a respeito da Religião como objeto, que no Brasil, sobretudo na Universidade de São Paulo, os estudos de Roger Bastide, Henri Desroche e Émile-Guillaume Leonard, os dois primeiros cientistas sociais (sociólogos) e um historiador.
Roger Bastide, pensador que deu o início à sociologia da religião no Brasil, pois partindo de Émile Durkheim toma a religião como fato social, sendo assim pôde ser tomado como objeto de investigação da sociologia: “Bastide, embora busque situar-se o mais firmemente possível nos limites da sociologia, abre sulcos na direção da interdisciplinaridade indispensável para nossos objetivos atuais”. (p. 256)
A fundamentação que justifica que a religião pode ser estudada como objeto de investigação sociológica está na premissa de que esta investigação seria pautada no estudo das representações sociais das “divindades”. Mas há a problemática da relação que se estabeleceu entre sujeito e objeto, visto que há a pretensão de neutralidade científica (cientificismo ortodoxo), e esta relação pode comprometer a compreensão advinda da descrição do fenômeno em questão. Dizemos pretensão de neutralidade, pois um pensador alemão chamado Gadamer (contemporâneo nosso) em sua obra prima “Verdade e Método”, coloca em causa esta pretensão de neutralidade no conceito “espírito histórico”, que não invalida a “epoqué” (suspensão de juízo), mas disciplina na elucidação do lugar de fala e o que constitui essa fala, portanto o fato do pesquisador professar um credo ou não, de modo nenhum invalida a investigação ao objeto, mas o qualifica enquanto se tem a consciência do lugar de fala e o conteúdo que se fala para daí aos que analisarem a pesquisa validarem o grau de distanciamento e honestidade intelectual da descrição do fenômeno.
Bastide segue o método comparativo, que apesar de ter seguido uma perspectiva “evolucionista” da escola da História das Religiões, ele se atém à utilidade metodológica em compreender uma religião pela outra com o escopo de entender semelhanças e dessemelhanças, esse método consiste em cotejar as crenças e as práticas, buscando pôr em relevo as dessemelhanças, ao contrário das semelhanças como poderia parecer mais atraente, esse método trabalha, também, com pares em todas as religiões: sagrado e profano, positivo e negativo, e assim por diante. Nesse ponto, sugerimos a obra de João Batista Libânio, “Formação da Consciência Crítica” (vol. 1), onde ele desenvolve uma análise das representações provenientes dessa dicotomia da realidade pelo esquema mental da religião em um dado momento mental.
De sua pesquisa, Bastide, traz para compreensão do fenômeno religioso o conceito proveniente da relação “Sagrado instituínte e Sagrado instituído”, onde percebe-se a tensão entre o instituído e a perspectiva do poder e o controle ao instituínte que produz e tem a possibilidade re-significar o Sagrado, assim percebe-se o movimento dialético presente neste ir e vir, pois o instituínte num dado momento torna-se instituído e no momento em que é instituído procura regular e/ou tolher o instituínte mediante a possibilidade de mudança do “status quo”, reestruturar as forças de poder e assim “encarnado” nas relações sociais.
Henri Desroche, que foi tomado como “un passeur de frontières”, por não ter tido como Bastide “anos brasileiros”, mas passou muitas vezes pelo Brasil colaborando com suas investigações na descrição e compreensão da religião, sobretudo do campo religioso brasileiro. Ele voltou sua atenção para os movimentos messiano-melenaristas e o cooperativismo: que “são expressões da esperança humana num mundo mais humano e igualitário: o primeiro cultiva a esperança sobrenatural na história e o segundo age no sentido do igualitarismo social”. (p. 280)
Desroche já retoma a discussão ao quesito sujeito que investiga, que para ele, o investigador para aprofundar bem seu estudo da religião tenha pelo menos uma vez na vida ter passado por uma profissão de fé, que o instrumentalizará na compreensão do fenômeno religioso de “dentro” da perspectiva religiosa e sua linguagem, que o habilitará, ao fazer a “cisão”, que nós chamamos de “epoqué” ao Sagrado instituído e o Sagrado instituínte”, (como o propõe Bastide), ao observar e refletir sobre esse fenômeno, saiba do que se trata.
Para não tornar-se por demais enfadonho, fastidioso e não cairmos no risco de um pontilhismo, nessa nossa exposição, vamos elencar os elementos essenciais de Desroche que são quatro: esperança, deuses de homens, homens de espera e religiões atestadoras e contestadoras. Claro que todas sob a base da compreensão do conceito de “esperança” que fundamenta o pensamento de Desroche.
Émile-Guillaume Léonard, considerado como o maior historiador do protestantismo, contribuiu para a compreensão do fenômeno religioso e do campo religioso brasileiro, como “iniciador da historiografia protestante no Brasil nos trilhos da pesquisa científica, pois até então os historiadores do protestantismo eram formados em teologia e limitavam-se à uma história confessional, apologética ou polêmica e edificante”. (p. 288)
“Quanto ao conteúdo do pensamento histórico de Léonard, três questões assumem relevância para o estudo da religião: primeiro, que a Reforma foi uma rebelião de leigos, príncipes e camponeses, e transitou pelo história na esteira do testemunho e obras de grandes homens que quase foram condenados pelas Igrejas ou postos em dificuldades por elas (1964, p. 63); segundo, que a salvação do mundo não está no ecumenismo, no confessionalismo e nem no comunismo, mas nos limites da Palavra de Deus; terceiro, que o que interessa no estudo da religião é o comportamento da massa de fiéis, dos ‘marginais’ da instituição religiosa”. (p. 289)
“Embora o objeto histórico de Léonard seja o cristianismo protestante, seu ponto de vista sobre o recuo constante dos homens às origens da religião (profetismo, laicismo, intervenção do Espírito) é útil para o estudo de qualquer religião”. (p. 290).No que vimos, refletimos, analisamos e apresentamos neste trabalho, cabe-nos findar tomando como posição que estes senhores descritos supra, apresentaram elementos justificadores e plausíveis para admitir que a religião, enquanto fenômeno humano, como um objeto para a ciência estuda-lo e levá-lo em consideração, pois esse fenômeno (a religião) possui uma profunda influência e condução nas relações sociais, portanto, o que se pressupõe que há posições presentes na Academia hoje tão dogmática em rejeitar a religião, pois na verdade tenta-se encobrir, com muita retórica, pré-conceitos e questões mal-resolvidas em referência à religião. É interessante que esta negação da religião enquanto objeto de investigação demonstra por parte dos mesmos opositores, como já dissemos, estarem imbuídos do mesmo comportamento dogmático de mesma natureza ao evidenciado em muitos indivíduos religiosos, dos quais criticam tanto. No que diz respeito a essa compreensão do comportamento dogmático em sua essência, pois de forma muito reducionista do conceito se compreende comportamento dogmático somente aos religiosos e não se trata só dos religiosos, mas todo aquele que engessa verdades e delas não dispõe distanciamento crítico. Como sugestão, oferecemos para aprofundamento do tema a obra do pensador Gerd A. Bornhein, “Introdução ao filosofar: o pensamento filosófico em bases existências”.

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